Só me apaixonei, assim, de verdade, uma vez na vida. Não foi
bonito, nem único. Foi pelo beijo ou por aquele elemento inexplicável que só
quem teve sorte de dar um beijo desses na vida pode entender. Bastou um beijo.
Só um. Não precisei saber se ele gostava dos filmes do Woody Allen, não fazia
ideia se tinha a mente aberta, não tive como constatar se ele se preocupava com
as pessoas, nem se tínhamos afinidades de pensamento. Simplesmente algo naquele
beijo dizia muito mais que tudo isso ou talvez através de um beijo se diga
coisas um ao outro que só depois são ditas com as palavras, ou que nunca são
ditas. Um beijo foi preciso pra que eu soubesse que não ia se repetir com outra
pessoa. Um beijo e eu tive certeza que era ele.
O beijo dele.
Só que meu beijo deve ter sido calado. Acho que estava
encantado demais com aquele momento pra ter dito algo. Então ele não soube de
tudo que eu tinha acabado de descobrir. Um beijo só foi necessário pra que ele
soubesse que não era eu. Independente do que eu poderia ser, apesar das afinidades
que viríamos a descobrir, não era eu. Num só beijo, dois beijos: um calado, um
falante. O meu e o dele. Então nós soubemos tudo o que só um beijo pode dizer.
Se não fosse aquele beijo, eu seria livre. Livre pra
entender que outras pessoas, com outros beijos, poderiam ser bons pares pra
mim. Livre pra namorar, pra amar, com beijos que não diziam tanto, mas com
atitudes que superariam isso. Livre pra não dar a um beijo valor maior do que
se dá a um beijo.
Mas não, aquele beijo aconteceu e eu tive a sorte de sentir
o que poucos tiveram a chance. E tive o azar de me aprisionar ao que só
aconteceu uma vez e que eu vou sempre procurar em outro alguém, mas que nunca
vou achar.
Só ele guarda aquele beijo e não sei se o beijo diz o mesmo
que disse a mim pras pessoas que ele beija agora. Não sei se é um segredo
nosso. Não sei se é um segredo só meu.